Como sobreviver a este ano sem fantasia? Como sobreviver a vida sem fantasia? A fantasia nos salva da realidade? A fantasia nos tira da realidade? Até onde precisamos de fantasia? O que é fantasia e o que é idealização? Como lidar com a frustração de fantasias desfeitas pelo conflito com a realidade? Escrever é fantasiar? Paixão é fantasiar? Aonde cabe a realidade? O quanto cabe em nós de realidade? Ser sonhadora é negar a realidade ou um modo de lidar com ela? Ser sonhadora é negar a realidade ou um modo de transformá-la?
23/12/2020
19/12/2020
Reiki
Entre o encontro do rio e do mar, fiquei presa. Meu desejo era nadar, sentir o sal, limpar o corpo. Existia uma linha invisível me separando. Me prendendo. Me tolhendo.
Depois me vi no alto da montanha, querendo voar. Sabia que eu podia em devaneio. Fui até a beira, mas me contive ali em cima com a vista imóvel. Era como se existisse um alguém me segurando. Me amedrontado. Me impossibilitando.
Por fim pulei em um rio límpido, com vontade de mergulhar fundo e rolar e nadar. Mas havia uma camada me deixando apenas na superfície. Como se estivesse me mantendo. Me isolando. Me desconectando.
A linha. O alguém. A camada. Sou eu.
Tem palavras expressas que só a voz emite.
17/12/2020
Navio
14/12/2020
Apego
27/11/2020
Tecer
Em uma roda de mulheres feministas
As sábias camponesas ensinaram
A costura dos retalhos da vida...
Delineamos a colcha
Fio a fio
A agulha fura
Como também remenda
Essa é a grande arte de ser mulher
Não aprender a costurar
Mas costurar a si mesma
10/11/2020
Mulher cis
28/10/2020
O que é o amor?
Nunca hei de saber sua essência, acho que até hoje devo ter sentido com tantos outros sentimentos mesquinhos, que o confundem, o limitam, o destroem. Ainda é por ele que ouso pular do penhasco, ainda em seu nome que busco a liberdade de ser inteira e compartilhar o que carregamos de bom por dentro. Sem esquecer de aprender no que é preciso evoluir.
Se talvez eu o entendesse em seu âmago estaria hoje mais perto do que sou? Ou melhor, será que eu estaria mais próxima de entender o que quero ser? Acho que o amor é isso. A gente descobre a si mesma, porque se é tudo que falam, que pensam, que sentem, que querem, que desejam, que buscam, que escrevem, se é essa coisa que faz a vida valer a pena, é por ele que a gente entende o que estamos fazendo neste planeta. Ainda estou longe de compreender o amor, então.
Não é por ele que estamos aqui em uma doença tão fisiológica quanto social, que atinge pessoas, que definha os sonhos, não é por ele que nos sentimos apartadas da natureza, não é por ele que jogamos um bomba atômica na nossa própria casa. A doença é resposta a falta de amor. Mas é por ele que deitamos na areia, na beira do mar, caçando estrelas cadentes e conjecturando o que há além de nós.
Querer além de nós é amor. Talvez eu sinta tanto amor, mas embebido de egoísmo, carências, traumas, ciúmes, que me faz o confundir com a doença. Com a dependência. Eu não sei ainda decifrar o que é amor e o que não é, eu não sei quando ele chega. Eu não sei ainda lidar com sua temporalidade das estrelas cadentes, ainda que nesta queda livre eu seja uma passarinha.
Não basta ter asas, é preciso se libertar das gaiolas mentais. São nelas que habitam o desamor. Só em voo livre se ama em autenticidade. E alteridade.
16/10/2020
Armário
É descabido, mas ainda assim a gente se encaixa. É sufocante, mas ainda assim a gente respira. É destrutivo, mas ainda assim a gente sobrevive. É perda de prazer, mas ainda assim a gente tem conforto. É negar a essência, mas ainda assim a gente se encontra. É impalpável, mas ainda assim a gente se amarra. É preto e branco, mas ainda assim a gente vibra colorido. Até que essa vibração encontre espaço suficiente, se expanda ao nível que o armário seja uma ponte, um avião, um guia até alcançar a felicidade da auto aceitação. Qual o tamanho do seu armário? Qual a profundidade de sua extensão? Por quais fragmentos você ainda o habita? O quão deslocada, sem ar, morta, frígida, perdida, presa, sem cor, você ainda se sente? O que falta para ele se tornar um completo condutor da sua profunda felicidade? É possível?
18/09/2020
Intuição
É como cheiro de barata. Inconfundível. O faro aponta: há uma barata no ambiente. Não tem erro. Pode ter fuga. Por medo, nojo, preguiça, raiva... Nunca por indiferença. A intuição é como cheiro de barata. Sinalizadora. Hoje eu matei a barata e a mandei descarga abaixo. Agora o que faço com meu faro que, através desse odor forte tomando conta do banheiro, aguçando os outros sentidos, indica que eu estou traindo a mim mesma?
25/08/2020
Virgem
escorro
toda vez que te observo
fico eu descendo entre as pernas
alcançando o chão
te fitando debaixo
que visão!
você traga, fala, come, anda, para
e eu saio das entranhas
buscando ganhar espaço
ou fazer o sentir ir para além de mim
e quem sabe te alcançar
se derretida estiver também
19/08/2020
Balança
De canto de olho eu observo, como quem finge nem ouvir a conversa, mas atenta escuta cada detalhe. É como se estivesse chegando em um lugar desconhecido e o instinto aconselha observar as saídas para possíveis perigos, na verdade eu já esquematizei todas as estratégias. Ora despretensiosa, como quem está atrás de uma boa fofoca, ora em alerta, como espera uma catástrofe. Ou como quem já sabe da catástrofe? Não sei... Não sei se sei ou se quero fingir não saber.
Mas de olhos bem abertos, mirando, encantada, eu me jogo numa deliciosa conversa daquelas de perder de vista ano, dia, pandemia. Ou então me pego solta em um lugar sem nenhuma proteção, mas completamente estasiada a ponto de me sentir em casa. Assim não tem ora isso ora aquilo, essa sou eu apaixonada, deslizando na felicidade, planejando antes de dormir, construindo pontes, devaneando os passos seguintes, sorrindo tão boba, que faz até parecer as coisas terem sentido...
Ela pende para que lado?
24/07/2020
Queda livre IV
20/07/2020
13/07/2020
Notas pandêmicas V
02/07/2020
Notas pandêmicas IV
12/06/2020
Se
30/05/2020
Andarilha
28/05/2020
Ribeiro
18/05/2020
Um pedido
Eu ouviria tuas histórias engraçadas de rir até doer a barriga. Aproveitando pra te admirar sem você nem desconfiar. Te ouviria tocar e cantar, provando que a paixão sempre tem locais ainda não visitados. Te ouviria falar com o olhar, porque o teu diz muito. E nós conversamos de várias maneiras.
Eu descobriria o espaço do meu quarto com a tua presença. O movimento do sol, as entradas de luz, o tamanho da cama para duas mulheres pequenas. Te deixaria dar cheiro e energia, dar sentido e marca. Pra te gravar além do que já tem em mim. Pra expandir teu lugar.
Eu estaria mole, boba, serena, despreocupada, romântica, dada, fofa, embriagada, preguiçosa, namorada. Se por hoje eu te tivesse.
05/05/2020
Notas pandêmicas III
04/05/2020
Porta destrancada
21/04/2020
Trigésimo quinto dia
a yoga ensina
que liberdade é
não se comparar
Enquanto cozinho
com Raul Seixas aceito
que felicidade é ter amado
mais de uma vez
Enquanto tomo banho
Liniker faz desejar
que você me chame de
tua
19/04/2020
Notas pandêmicas II
17/04/2020
Amor maior
09/04/2020
Notas pandêmicas
06/04/2020
Vigésimo dia
Fazendo presença no sonho, entrando em contato disfarçadamente, falhando em letras de músicas, errando em te registrar nas palavras, me enganando em te cravar na mente, traçando planos impossíveis para te ver, dispondo de energia e tempo para te manter comigo, prossigo contando os dias...
Essa é a natureza doentia da paixão, essa a é essência do que me causas... Sem chão, sem proteção, ainda mais desequilibrada. Avalio os riscos, sei que estou entregue então de que adianta se já apostei todas as fichas? Descubro que os riscos se ampliam se não disponho mais de fichas, no entanto me mantenho contando os dias...
Doente estou eu.
30/03/2020
Período fértil
27/03/2020
Décimo dia
me mantém com o pensamento vivo
tentando te encontrar na pouca memória
Estranho ser pouco o tempo
e grande a vontade
Busco descobrir que rumo seguir
que seja o certo
Deixar o tempo que será muito minar a vontade
até que seja pouca?
Ou domar o tempo para que seja insuficiente
em abrandar o querer?
Na dúvida traço percursos
toco alfaia
tomo um vinho
busco teu cheiro
E cá me pego eu
acompanhando os teus rastros...
Quando vi meus muros desconstruídos
a vida ergueu outros
Mas o coração segue selvagem como de Belchior
trilha os comandos da alma
se esquivando da razão
A bússola está viciada
direcionando sempre ao mesmo ponto
e me entregando de bandeja
Ela só atende a esse ímã
que é você
22/03/2020
Pandemia
me parece que tudo é devaneio
o tempo passa lento
e a distância se torna maior
me certifico do amor
torço pelo reencontro
temo a morte
combato a ansiedade
planejo a semana
o tempo à passos lentos
são só cinco dias eu repito
a distância à passos largos
estamos na mesma cidade
eu, família, amizades, quereres
estamos no mesmo país
brasil que somos
superando mais um colapso
todas as pessoas estão no mundo
distantes
contando no relógio
esse tempo de pandemia
o que salva é lembrar o mar
o som das ondas
o mergulho
o vento forte
as pegadas na areia
tudo é passageiro
19/01/2020
Homofobia
porque exige reconhecer a podridão do mundo
e que ela me atinge como uma tsunami
quem ousa repudiar o feio
para construir o novo, o belo
- e não há maior beleza do que a liberdade -
se espanta e se desmorona
quando encara as prisões
que pela pequeneza dos seres humanos
nos imputam
é difícil verbalizar, escrever, reconhecer
essa palavra
nas teias da vida
estou presa
desejam cortar minhas asas
mal sabem que eu
e as pessoas
foram e são feitas
para voar
ela não vai me manter no chão
daqui observo o céu
o bem está lá
não vou esmorecer
tenho a força e a coragem para construir saídas
que me levarão a serenidade
de ser quem eu sou
e amar conforme meu coração pulsa
11/01/2020
Dia de lua cheia
Foi o que me colocou em um nível extremo de encontrar o amor próprio que julguei já ter muito... Que engano! Ele tem mais a ver com se entender neste mundo, se permitir ao medo, ao choro, a insegurança, entender que o sofrimento é passagem, do que se enxergar bela, interessante e autossuficiente.
Enxergo quem sou, quem me tornei, o que desejo ser e aonde quero chegar. O tempo é meu grande amigo.