02/07/2020

Notas pandêmicas IV

Boiar olhando o céu sem óculos, para que não impeçam os raios do sol ofuscarem um pouco a visão. Abrir o corpo, descansar o corpo, deixá-lo ir. Se balançar no vai e vem das ondas, soltar o controle da vida, reconhecer sua imprevisibilidade. Não se sabe os graus de temperatura do dia, a força da maré, o peso do corpo. O peso do corpo que carrega. Dor. Culpa. Desespero. Não se sabe, mas ao boiar entrega. E entregando deixa ir. O que fica, no mergulho se vai. O sal e a potência da água abraçam a gente e por isso dizem que nós seres racionais não respiramos em submersão. Não há aconchego maior! E aí reside o perigo. Mergulho por muito tempo é bolha. Que seguro seria morar em um mergulho (é como regressar ao útero). Mas não seria imprevisível. Por isso retornamos ao ar, retomamos o ar. Buscando respiro, o céu, a imensidão do horizonte, a incógnita de ser pessoa humana. 

"O que sei: sou do mar. Vivo de saldade."

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